Chapter Text
===Dagma===
Tingsi me levou para o meu quarto. Às vezes ela ia até a porta para ver se tinha alguém no corredor. Algum tempo depois a Huang Jia entrou no quarto e alguém trouxe um copo de água com açúcar. Elas ficaram comigo até que eu me acalmasse. Contei a elas sobre o encontro com o meu pai.
- Ele veio assim, do nada?! – Disse Tingsi.
- Sim. Eu não entendo. Depois de todo esse tempo.... Eu não esperava encontrá-lo assim. Isso não faz sentido!
- Ele disse estava com problemas. – Disse Huang Jia. – Ele te contou o que era? – Balancei a cabeça negativamente.
- O que você acha disso tudo? – Perguntou Tingsi. – O que você está sentindo?
- Eu não sei! Nunca pensei que um dia.... Vocês devem me achar uma idiota!
- Não, é só muita coisa para absorver. Ele te disse o nome dele e o que era?
- Não. Ele não me disse nada.
Tingsi se ajoelhou e começou a analisar a minha capa, tocando o tecido e os broches.
- Esse tecido é diferente da minha, mas eu não vi nenhum tecido parecido. Esses símbolos não me são estranhos.
- São runas. – Tornou a dizer a fenghuang. – Infelizmente eu não as conheço.
- Nesse caso, eu tenho uma ideia.
Tingsi saiu do quarto e voltou com o notebook. Ela teve que explicar à Huang Jia o que era aquela coisa e nos contou que conheceu um cara chamado Taith que tinha uma capa igual a dela, mas com runas no lugar de coelhos.
- Jia, você conhece algum Clã Máni?
- Você me chamou de…?
- Não vou ficar te chamando de Huang Jia o tempo todo, isso cansa. Conhece ou não?
- Infelizmente não.
- Ótimo. Segundo o Google mani pode ser um restaurante, amendoim em espanhol.... Lenda da mandioca? – Ela via os resultados na tela.
- Mandioca?
- É um vegetal do Brasil. Uma mandioquinha frita cairia bem. Deu até vontade.
- Tingsi! – Chamei sua atenção.
- Vamos ver, runas. Consulta com runas, aprenda a ler runas, RPG runas.... Deixa eu ver nas imagens.... Aqui! Como Edlin disse, na capa de Taith tem as runas mannaz e laguz, já na sua são sowilo e dagaz.
- O que isso quer dizer?
- Eu sei lá, não entendo porra nenhuma de runas.
- Dagaz? – Huang Jia estava pensativa. – Isso não parece com o seu nome?
- Vamos ver, Dagma. O Google joga para Dagmar.
- Xuanwu uma vez disse que meu nome era variação de Dagmar.
- Deixa eu ver: nórdico antigo, donzela do dia, criada do dia, glória do dia. Não importa, é algo do dia.
- É possível procurar a origem dos nomes nessa coisa? – Perguntou Huang Jia.
- O que acabei de fazer?
- O que significa o seu?
- Ting é gracioso ou magro, além de ser onomatopéia para barulho de sino e Si parece que é um sobrenome e pode significar assumir o comando ou encarregar-se de um departamento. Dá para ver que minha mãe devia estar louca das ideias quando me deu esse nome.
Tingsi voltou a trabalhar no computador enquanto colocava música para tocar. Segundo ela era para trabalhar melhor e as músicas se chamavam Get Jinxed e Enemy, além de More e Pop Stars. Nós duas apenas olhávamos enquanto ela abria as páginas, lia o conteúdo e colocava informação no Power Point, ou seja lá o que isso é. Havia muitos anúncios, leituras e outras coisas, mas Tingsi disse que isso era mais ligado às crenças e adivinhação, mas não os descartava.
- Ok, ao que parece isso depende se estarão invertidas ou não. Mannaz quer dizer homem ou humanidade. Por esses sites, é ligada à integridade, fé, ajuda, altruísmo, conflitos, enfim, identidade e relacionamentos entre pessoas. Já Laguz quer dizer água ou lago e ao que parece é ligada à intuição, sonhos, emoções, ilusões, confusão, enganação.
- E as da minha capa?
- Dagaz é dia ou amanhecer, ao que parece está ligada à prosperidade, esperança, transformação, é um novo dia. No entanto a que mais chama atenção é a Sowilo, que significa sol. Está ligada ao sucesso, vitória, mas isso não importa. Sowilo é ligada diretamente à deusa Sól, a deusa do sol na mitologia nórdica.
- Por que isso é importante? – Huang Jia perguntou.
- Em quase toda mitologia, os deuses do sol e da lua ou são irmãos ou são amantes ou os dois, maas estão sempre interligados. Adivinhem qual é o nome do irmão dela?
- Sinto muito, mas eu não entendo de mitologia nórdica.
- Nem eu.
- Máni. Eu pesquisei e ele não tem uma runa própria, mas nessa confusão aparece muito a mannaz, porque eu acho que deve ser o M, e a laguz, que de alguma forma está ligada com a lua. Ou isso é uma puta coincidência, ou eu estou montando uma bela teoria da conspiração ou tem coisa aí.
- O que você acha que é? – Perguntei.
- Eu não sei. Pode ser alguma coisa ou pode ser nada e a gente só perdeu tempo.
- Eu não acho que tenhamos perdido tempo. – Disse Huang Jia. – Graças a você sabemos que o povo de Taith usa deuses nórdicos como nomes de seus clãs e runas como símbolos. Agora sabemos por onde procurar.
- Tem algo que não está batendo nessa conta.
- O que quer dizer?
- A minha capa é igual a do Taith, mas tem coelhos no lugar de runas. A da Dagma é um pouco diferente e não sabemos muita coisa sobre ela. Eu vou ter que perguntar a ele.
- Eu vou ver se encontro informações na biblioteca.
- Não, você fica com a Dagma para ter certeza de que ela está bem. Vou pedir ao Leiftan ou ao Edlin e depois passar para as aulas de dança.
- Eu quase me esqueci delas. Boa sorte.
Tingsi se aproximou de Huang Jia e a beijou antes de sair e levar o computador. Eufiquei confusa, afinal, quando foi que essas duas...?
- Huang Jia....
- É uma longa história, mas não tem com o que se preocupar, nossa relação é legítima.
- Valkyon e Leiftan estão sabendo?
- Sim, firmamos um acordo ontem. Parece que essa pesquisa serviu para para te distrair. Como está se sentindo?
- Eu não sei. Minha cabeça parece que vai explodir. Você tem algum remédio?
- Claro. Água com açúcar.
- Sério?
- Tenho um calmante fitoterápico, mas vai precisar descansar a mente.
Huang Jia me analisou e me deu o calmante antes de sair. Eu o tomei junto com a água com açúcar para me acalmar. Minha cabeça estava fervilhando com tantos pensamentos. Troquei minhas roupas e fui dar uma volta. Preciso falar com Ezarel e Nevra sobre o ocorrido. Optei por encontrar Nevra primeiro, assim vejo como a Karenn está.
Consegui encontrar Nevra pelos corredores, ao mesmo tempo, um homem também surgiu. Ele era claramente um vampiro, pálido, as orelhas pontudas, o cabelo preto até os ombros e os olhos esverdeados. Suas roupas eram vermelhas com detalhes dourados, brancos, alaranjados e azuis. Ele tinha um ar imponente. Nevra empalideceu.
- Nunca pensei que o veria novamente. – Disse o homem ríspido.
- O que você faz aqui?! – Nevra estava surpreso.
- O mesmo que você, eu presumo.
- Eu não acredito que te convidaram.
- Já se esqueceu que eu sou o líder? Onde está sua irmã?
- Não é da sua conta.
- Nevra, a gente precisa se preocupar? – Perguntei segurando o seu braço, ele estava trêmulo.
- Não é nada. Vamos.
Ele me pegou pelo braço e me arrastou pelo corredor. Ouvi um estalo e Nevra caiu ao meu lado. Eu o amparei. Ele tinha sido atingido por um chicote.
- Seu ingrato! Depois de tudo, você ainda me dá as costas?! – O chicote estalou de novo.
- NEVRA!
- Desculpe se eu não sou tão imoral quanto você. – Nevra reagiu.
- Moleque ingrato!
Ouvi o novo ressoar do chicote. Eu tentei defender Nevra esticando a mão. Um clarão surgiu e quando passou, o chicote tinha sido carbonizado, sobrando apenas cinzas na mão do agressor.
- O que está acontecendo aqui?!
- Príncipe Taerin! – Exclamei aliviada.
- Quarto Príncipe Taerin, isso não lhe diz respeito.
- Lorde Kieran, devo lembrá-lo que está na morada de minha família? Tudo aqui me diz respeito. – Ele veio até mim. – Vocês estão bem?
- Príncipe Taerin, me ajude a levá-lo até o Ezarel!
O tal lorde tinha ido embora. O príncipe Taerin me ajudou a levar Nevra até a torre de alquimia. Fionan e Liselle ficaram espantados quando nos viram e Ezarel correu para socorrer Nevra. Assim que pôs os olhos no meu namorado, as feições do príncipe mudaram, ele tinha um olhar de ódio em seu rosto.
Eles me ajudaram a levá-lo até o quarto de Ezarel ao mesmo tempo em que eu explicava o que tinha acontecido no corredor. Arrancamos a camisa de Nevra para ver as marcas, felizmente não havia sangue. Tirei uma pomada da bolsa e comecei a passá-la. O príncipe Taerin se desculpou com os alquimistas reais e comigo e olhou para Ezarel pela última vez antes de sair.
-Você não devia ter voltado. – Foram suas últimas palavras antes de ir embora.
- Eu não entendo. Ele não gosta de você, mas não te trata mal ou nos impede de te defender.
- Ele ainda não me perdoou pelo que aconteceu ao Edlin. – Disse Ezarel.
- Mas ele só ficou um ano sem sair do castelo.
- Foi isso que Edlin te disse? – Assenti.
- Ele mentiu, não foi?
- Edlin não ficou só preso, mas isolado de todos, tomou algumas chibatadas e por pouco não foi rebaixado a um civil e foi para a forca por ter me ajudado e me defendido.
Fiquei atordoada. Aquilo explicava por que o príncipe Garret o odiava tanto e por que o príncipe Taerin o evitava. Ezarel tomou as minhas mãos e as beijou, mesmo estando com resquícios de pomada. O pai dele voltou com um elixir e Ezarel fez com que Nevra o bebesse. O rosto do vampiro estava vermelho, o maxilar travado. Mudei de posição e coloquei sua cabeça em meu colo. Ele abraçou minha cintura com força, então fiz um cafuné. Esperei até que ele se acalmasse.
- Nevra, quem era aquele homem? – Perguntei com cautela.
- Era o meu pai.
- Ele está aqui?! – Ezarel estava perplexo.
- Infelizmente.
- Nevra....
- Ele não tinha esse direito! – Ezarel estava com raiva. – Vou falar com Edlin sobre isso.
- Ez, por favor, não!
- Eu preciso, Nevra! Pelo menos para deixar alguém de olho no seu pai para o caso de vocês se encontrarem de novo. Quem sabe o que pode acontecer na próxima vez?!
- Vamos mudar de assunto? – Pediu Nevra. – Dagma, por que estava me procurando?
- Deixa para lá, não importa mais. – Falei.
- Está com problemas, não está? – Perguntou o elfo.
- Dagma, você pode nos dizer. Não é porque eu estou com problemas que você deve esconder os seus.
- Eu conheci o meu pai.
- O QUE?!
Ambos estavam perplexos. Contei a eles tudo que tinha acontecido desde que saí da torre de alquimia até encontrar Nevra. Ezarel saiu correndo do quarto, me deixando sozinha com Nevra.
===Ezarel===
- EDLIN!
Eu o procurei por todo o palácio, pouco me importando com os olhares sobre mim ou se encontraria a princesa herdeira ou os monarcas ou qualquer um que me odiasse a ponto de me atacar pelos corredores. Ao menos eu não preciso me preocupar com Garret. Eu sei que ele me odeia e pode me matar sem dificuldades, mas ele é honrado e jamais quebraria as leis da hospitalidade, no máximo ele só vai me insultar. Edlin estava na biblioteca com Leiftan. Fiquei bem na frente dele.
- Preciso falar com você. Agora.
Ele nem fingiu me odiar, pois eu não estava brincando. O castelo tinha várias passagens secretas, nós dois as usávamos quando crianças para fugir das aulas. Fomos até uma torre um tanto esquecida onde nos escondíamos no passado.
- Quem é Taith?
- Tingsi não consegue ficar com a boca fechada?!
- Não é simples assim, Edlin! Quem é Taith?!
- É o meu amante. – Pisquei algumas vezes.
- Mas você não estava noivo?!
- Sim, mas você sabe que eu nunca gostei de garotas e este é um casamento político. Eu tento me livrar dele desde que foi anunciado.
- Por que não me contou?
- Eu mal consigo te enviar cartas e não sabia como te contar. Por favor, Ez, se alguém souber....
- Acalme-se, até onde sabemos, ele é só um amigo seu. Mas precisamos encontrá-lo.
- Eu não sei onde posso encontrá-lo, eu juro. Eu disse isso a Tingsi.
- Não é só Tingsi que está envolvida. Dagma conheceu o pai dela hoje e ele usava uma capa parecida com a deles.
- Ez, me diz que isso é brincadeira.
- Infelizmente não. Ele deu uma capa semelhante à Dagma. Receio que ele esteja com problemas.
- Como é essa capa?
- É vermelha, a composição do tecido é diferente, mas não é como os daqui e tem as runas sowilo e dagaz.
- Sowilo e dagaz? Desculpe, mas elas não me dizem nada. Ez, eu quero te ajudar. – Ele segurou minhas mãos. – Mas eu juro que não sei como encontrar Taith. Eu tento desde que nos conhecemos e não consigo descobrir de onde ele vem.
- Eu acredito em você. – Acariciei suas mãos.
- Você disse que o pai da Dagma está com problemas, que tipo de problemas?
- Eu não sei, por isso preciso encontrar Taith. Ele é a nossa única esperança.
- Não se preocupe. Ele me disse que virá ao baile.
- Junto com a família da sua noiva?!
- Por que acha que Taerin e eu sugerimos um baile de máscaras? Não é só porque meus irmãos não querem olhar para a sua cara feia, eu garanto.
- Claro, vocês seriam ofuscados pela minha beleza natural.
- Engraçadinho. Fico feliz de finalmente compartilhar sobre isso com você.
- Não esconda mais segredos de mim.
- Contanto que não esconda nada de mim, como o seu relacionamento triplo.
- Eu prometo. Por isso, preciso dizer uma coisa: Dagma está grávida.
- Seus pais vão te matar!
- Eu sei.
- E eu vou ser tio!
- Você nem sabe se é meu ou do Nevra.
- Não importa, mas se for seu, eu quero ser o padrinho.
- Combinado. Eu também queria te pedir um favor.
- Qual?
- Eu não sei se Taerin falou com você sobre o que aconteceu entre Nevra e Lorde Kieran.
- Não, aconteceu algo?
- Eles não têm um bom relacionamento e Nevra foi agredido. Eu gostaria que pusesse alguém de olho neles para evitar mais confusão.
- Vou falar com Taerin e Garret sobre isso. Acha melhor colocar alguém para vigiar Lady Lethia também?
- Ela também veio?!
- Eles são casados, o que você esperava?
- Por favor, eu agradeceria muito. Eu quero evitar sofrimento para ele e não quero que Dagma fique estressada.
- Farei tudo que estiver ao meu alcance.
===Dagma===
Naquela noite foi dado um grande banquete no salão principal. Finalmente pude ver os reis de Lund’Mulhingar. O rei Elrohir era um elfo loiro de olhos azuis, ele possuía o semblante rígido e severo, assim como a rainha Melian, que possuía o cabelo castanho e olhos de um azul escuro. A princesa herdeira Idril era loira de olhos azuis escuros. Ela estava sentada ao lado do Segundo Príncipe Theoden, um elfo de cabelos escuros. Ao lado dele estava o príncipe Garret, depois o príncipe Taerin, a Quinta Princesa Niena, que também possuía cabelo na mesma cor que os de Taerin, e por fim o príncipe Edlin.
Todos os convidados estavam no que seria o grande banquete de boas-vindas antes do baile. Apesar de ser um evento importante, todos da guarda estavam com as mesmas roupas de sempre, menos eu e Tingsi. Meu vestido tinha decote triangular, era simples e verde com muitas folhas e algumas flores cor de rosa, já o de Tingsi era azul claro e branco com joias prateadas, muito leve a ponto de parecer flutuar, tinha gola alta e as mangas eram separadas do resto do vestido.
Não pude evitar olhar a delegação de Yaqut. O pai de Nevra, Lorde Kieran, não tirava os olhos de nós. Ao lado dele havia uma vampira de cabelo rosa e olhos cinzentos, esta era Lady Lethia, a mãe do Nevra e da Karenn. Karenn não conseguia evitar olhar para eles e Nevra não soltava minha mão por nada nesse mundo.
- Nev, não se preocupe. – Pedi. – Ele não pode te fazer mal.
- Não é com isso que eu me preocupo.
- Aconteceu alguma coisa enquanto eu estava fora? – Perguntou Tingsi.
- Nada.
- Eu te explico depois. – Ignorei o olhar de Nevra, afinal, estávamos todos envolvidos nas confusões dos últimos dias.
- Tem alguma poção que dê para beber álcool sem prejudicar o bebê? – Tingsi resolveu mudar drasticamente de assunto. – Depois dos últimos dias estou precisando de um verdadeiro porre.
- Desde quando álcool prejudica a gravidez? – Perguntou Valkyon.
- Idade Média é foda mesmo. Sim, causa problemas, por isso precisa ser evitado.
- Minha mãe sempre tomou vinho nos jantares mesmo grávida de mim e eu sou abençoado pelo Oráculo. – Disse Ezarel com um de seus sorrisos cretinos.
- Mais um motivo para não beber. – Não pude evitar de rir enquanto Ezarel ficou com uma cara azeda.
- Nesse caso, também não irei beber. – Anunciou Leiftan.
- Você pode, eu que não.
- Mas se eu beber, você ficará com vontade e eu não quero dormir com você resmungando que não pode beber.
- Concordo. – Disse Valkyon. – Já estamos sofrendo o bastante com sua compulsão por comer coisas da Terra.
- Belos namorados que eu tenho.
Apesar de termos conseguido descontrair o clima, Nevra parecia alheio às nossas conversas. Sua majestade, o rei, fez um discurso nos agradecendo por ser salvado Eldarya. Nevra tinha bebido sua taça de vinho em um só gole.
- Como estão seus ferimentos? – Perguntei à Karenn.
- Melhores, não se preocupe com isso.
- Como não? Fui eu que te feri.
- Podemos falar sobre isso em outro lugar?
Apenas concordei. Deixamos o salão e fomos para um dos pátios. A chuva tinha parado há tempos, o ar estava mais puro.
- Me desculpe. – Disse ela. – Eu estava com tanto medo de perder o meu irmão que não percebi que quase prejudiquei todo mundo. Eu sou mesmo uma egoísta.
- Não se preocupe com isso, já passou. Eu até esqueci.
- Mesmo? Eu quase.... – Ela ficou quieta. – Eu sei que Ezarel não iria me perdoar.
- Aconteceu tanta coisa que eu não tive tempo de ficar brava. Vamos apenas esquecer isso.
- Então está bem. Esse filho que você está carregando é do meu irmão ou do elfo chato? – Ela parecia um pouco mais animada.
- Eu ainda não sei.
- Já pensou nos nomes?
- Não é um pouco cedo para isso?
- Mas já deve ter algo em mente.
- Ainda não.
Karenn estava mais animada na volta para o banquete. Achei melhor não tocar no assunto dos pais dela, pois tínhamos acabado de nos reconciliar e eu não queria preocupá-la com o que aconteceu com Nevra. Assim que voltei ao salão, vi que Nevra não estava na mesa. Ao olhar para a delegação de Yaqut, vi que lorde Kieran também não estava lá. Resolvi procurá-lo pelos corredores. Finalmente eu o encontrei, mas infelizmente estava com o pai dele e eles estavam brigando.
- Eu te dei tudo, olha como você me retribuiu!
- Eu nunca pedi por aquele casamento! Muito menos assumir os seus negócios sujos!
- Você não reclamou quando eu o iniciei.
- Eu fazia para ter a sua aprovação e me arrependo até hoje.
- Você sempre foi fraco, um moleque mimado e ingrato. Você só me decepcionou, Nevra.
Nevra fechou a mão em punho e não disse mais nada. Ele estava visivelmente abalado, eu precisava fazer alguma coisa. Senti uma mão agarrar meu pulso e torcê-lo em uma chave de braço. Fui empurrada na direção deles, atraindo a atenção.
- Parece que temos companhia. – Escutei a voz feminina dizer.
- Dagma?! – Ele estava incrédulo.
- Ora, se não é a garota que estava com você mais cedo. – O pai dele olhou perigosamente para mim.
- Mãe, solta ela! – Pediu Nevra. – Ela não tem nada a ver com isso!
- Você ainda ousa me chamar de mãe?
- Nevra, eu sinto muito. – Falei.
A mãe dele apertou ainda mais meu pulso, me fazendo gemer de dor. Ouviu um grito vindo dela. Instintivamente meus poderes tinham se manifestado e meu pulso a tinha queimado, me libertando dela. Eu a empurrei por instinto com o punho irradiando calor, o que deixou marca não só em suas roupas como na pele. O pai dele correu para me atacar, mas eu fiz surgir um clarão por instinto. Quando eu percebi, tinha queimado o braço dele. Nevra veio até mim, pegou a minha mão e saímos correndo do local. Na fuga, encontramos o príncipe Garret.
- Parados aí!
- Príncipe Garret, não é o que você pensa! – As palavras saíram sem que eu pudesse pensar.
- Dagma, está tudo bem?! – O príncipe Taerin apareceu ofegante e um tanto bêbado. – Correr mata. Vimos uma luz muito forte, era você?
- Príncipe Taerin, eu posso explicar!
- Não foi culpa dela. – Disse Nevra. – Foi por minha causa.
- As pessoas de Yaqut estavam implicando com vocês de novo?! Eles não têm vergonha! Ainda não entendo por que eles foram convidados.
- Assuntos do reino, Taerin. – Disse o príncipe Garret. – Você deveria prestar mais atenção.
- Estão machucados?
- Estamos bem. – Nevra pôs o braço ao redor dos meus ombros.
- Desculpe, era para eu ficar de olho neles, mas o vinho estava tão bom!
- Pare de brincadeira, Taerin. Irei escoltá-los até seus quartos e ficar de olho neles. Não é a primeira vez que Yaqut nos traz problemas.
- Muito obrigada.
O príncipe Garret nos escoltou até os nossos quartos. Ele nos fez algumas perguntas e tivemos que falar sobre o incidente. Resolvi colocar o meu pijama e descansar um pouco. Nevra apareceu na minha porta e dei espaço para que ele entrasse. Ele pegou meu pulso e começou a massageá-lo.
- Ela te machucou? – Sua voz era manhosa.
- Eu estou bem. Eu posso me cuidar.
- Eu sei, mas não deixo de ficar preocupado.
- Nevra, qual é o problema entre vocês?
- Eu realmente não quero te envolver nisso.
- Eu já estou envolvida, Ezarel também e até a família real. Me conta, o que está acontecendo?
Nevra respirou fundo e tomou minhas mãos. Ele me guiou até minha cama onde nos sentamos.
- Yaqut é um vilarejo retrógado. Eu nunca saí de lá, minha vida era limitada aos limites do vilarejo. Desde pequeno eu fui ensinado a sempre ser leal ao meu clã de uma forma doentia, beirando ao fanatismo.
As mãos dele tremiam. Passei uma de minhas mãos por um de seus pulsos em uma carícia para que ele continuasse. Não estava sendo fácil para ele me contar aquilo.
- Minha família caçava humanos de Eldarya e outros faeries para estocar sangue, às vezes eles caçavam por diversão. Não é para menos que eles estão ligados a um monte de assassinatos suspeitos e desaparecimentos.
- Você fez parte disso?
- No começo sim. Eu estava tentando ganhar a aprovação do meu pai, mas eu só cuidava dos cadáveres. Quando ganhei minha primeira missão, eu não consegui matar. Aquilo era tão errado. Eu....
- Foi por isso que você fugiu?
- Sim. Eu não aguentava mais aquela situação, mas meus pais não se importavam. É normal que haja casamentos arranjados em Yaqut, tanto que eles até arranjaram o meu para me forçar a assumir os seus negócios, já que eu sou o primogênito. Eu não tive escolha a não ser fugir. Karenn me seguiu e fomos acolhidos pela guarda. Eu nunca pensei que um dia isso fosse voltar.
- Nevra....
Eu o abracei e pus sua cabeça em meu colo. Fiquei fazendo carinho e cantarolando alguma melodia até que ele dormisse. Assim que ele dormiu, eu o ajeitei na cama e tirei seus sapatos. Deitei e o puxei para mim, de forma que sua cabeça ficasse por sobre meu ombro. Eu nunca o tinha visto tão fragilizado.