Chapter Text
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"Você é do clã Hyuuga, né? Seus olhos dão medo!"
O riso cortou o ar gelado, ecoando entre as casas baixas cobertas pela neve. Outro garoto se juntou à zombaria, os braços cruzados, o sorriso cruel.
"Aposto que você é um monstro!"
Mais gargalhadas.
Hinata recuou um passo, os ombros curvando-se como se pudesse se esconder dentro do próprio corpo. Suas mãos delicadas foram direto ao rosto, tentando bloquear as palavras que, ainda assim, entravam fundo demais. As lágrimas começaram a escorrer, manchando as luvas brancas.
A poucos metros dali, no velho balanço enferrujado da região, Naruto assistia à cena. O estalo da corrente ao vento foi abafado pela sua respiração pesada. Ele cerrava os punhos, os olhos azuis queimando de raiva.
"Ei! Parem com isso!"
Sua voz cortou o riso dos meninos, firme e carregada de fúria.
Um deles se virou, erguendo a sobrancelha. "E quem é você?!"
Naruto deu um passo à frente, o rosto marcado pelo rubor da irritação. A veia em sua têmpora pulsava.
"Eu sou Naruto Uzumaki, e serei o próximo Hokage de Konoha!"
Ele juntou as mãos em um selo rápido, a neve rodopiando ao redor dele com o movimento.
"Jutsu: Clones da Sombra!"
Uma explosão de fumaça preencheu o ar, mas quando se dissipou, uma figura minúscula e desajeitada caiu ao lado dele, encolhida e ofegante. O clone mal tinha equilíbrio para se manter de pé.
Os meninos primeiro se assustaram, depois caíram na risada. O som soou ainda mais cruel contra a tranquilidade do entardecer.
"Olha só isso! Que patético!"
Eles avançaram, e Naruto não recuou. Um chute o derrubou na neve gelada, outro soco fez sua respiração falhar. O tecido vermelho em volta do pescoço dele foi arrancado sem piedade — o cachecol, gasto pelo tempo, agora rasgado em duas partes.
"Isso é seu?!" O garoto jogou o tecido na neve, pisando sobre ele até deixá-lo manchado de lama e gelo.
Risos. Passos apressados. E então, silêncio.
Hinata só conseguiu se mover quando o som das vozes se afastou. O coração dela batia descompassado, a respiração curta, e as lágrimas turvavam sua visão. Ela correu até Naruto, ajoelhando-se ao lado dele.
"N-Naruto-kun… você está bem?!"
Ele tossiu uma risada, levando a mão à nuca. O sorriso apareceu, hesitante mas determinado, como se nada tivesse acontecido.
"Tá tudo bem! Não foi nada demais… eu nem senti direito."
Hinata o olhou fixamente, os olhos marejados negando as palavras dele. As gotas quentes escorriam sem parar. Ela sabia — era culpa dela. Se não tivesse estado ali, se não tivesse chamado atenção com aqueles olhos que todos odiavam, Naruto não teria apanhado.
"É minha culpa… é tudo minha culpa…" sua voz falhou, embargada.
Naruto se ergueu com esforço, apoiando-se em um joelho. O sorriso dele vacilou ao ver o quanto ela tremia. Com cuidado, pousou a mão em seu ombro pequeno, o calor passando por entre camadas de frio.
"Ei… tá tudo bem mesmo." Sua voz abaixou, séria. "Seus olhos… são lindos. Parecem pérolas preciosas."
O rosto de Hinata explodiu em vermelho. As lágrimas pararam de cair, substituídas por um silêncio confuso. Os dedos dela se entrelaçaram instintivamente, cutucando um ao outro em busca de uma saída para aquele turbilhão de emoções.
Naruto, talvez percebendo o peso da própria frase, se afastou rápido demais. "Eu já vou indo, tá? Até mais, se cuide, e se eles te incomodarem de novo me avise, na próxima eles quem vão se machucar, dattebayo!
Ele saiu correndo, deixando pegadas desajeitadas na neve.
Hinata ficou ali, o peito apertado, o coração batendo tão forte que parecia doer. Seus olhos baixaram, e ela viu o pedaço do cachecol caído na neve. Com delicadeza, pegou-o entre as mãos, pressionando contra o peito. O tecido ainda guardava o cheiro dele, quente e reconfortante.
Ela o abraçou com força, fechando os olhos.
"Naruto.."
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Os anos passaram como vento frio que atravessa a vila, levando consigo rostos conhecidos e trazendo outros novos. Naruto já não era mais aquele garotinho caído na neve com o cachecol rasgado — agora caminhava pelas ruas de Konoha, com passos firmes e um sorriso largo, mesmo que os olhares que recebia fossem tão pesados quanto antes.
Murmúrios. Cochichos. Expressões fechadas que se disfarçavam tarde demais.
Ele fingia não ouvir. Sempre fingia.
Foi nesse cenário que a voz aguda e excitada de uma garota capturou sua atenção.
"Amiga, eu descobri quem é o garoto que eu estarei destinada!"
O riso dela veio junto, seguido de pequenos gritinhos de alegria.
"É mesmo?! Ah, eu também devo descobrir em breve…!" a outra respondeu, com o mesmo entusiasmo.
As duas se abraçaram, girando de leve, como se estivessem dançando em segredo no meio da rua.
Naruto parou no meio do caminho, os olhos arregalados e o coração batendo mais rápido. Ele ficou observando por alguns segundos, sentindo a animação contagiar até mesmo seus pés inquietos. Antes que percebesse, já estava pulando à frente delas.
"Ei, meninas!"
O susto foi imediato. As duas se afastaram uma da outra, os olhos arregalados e os sorrisos apagados. O abraço se desfez como se nunca tivesse existido. Quando notaram quem era, os rostos delas se endureceram, carregando aquela sombra que Naruto conhecia bem.
"O que você quer?" a mais alta perguntou, o tom frio demais para a idade.
Naruto não pareceu perceber. Ele inclinou a cabeça, curioso, o sorriso meio torto.
"Esse negócio de alma gêmea… é pra todo mundo?"
As garotas trocaram olhares. A menor pareceu hesitar, mordendo o lábio inferior, até que finalmente cedeu:
"É… sim. É pra todos."
Naruto deu um pulo no ar, os braços levantados como se tivesse vencido uma luta. "Isso é incrível! Então quer dizer que eu também vou ter alguém destinado pra mim!"
Mas a outra garota cruzou os braços, cortando o momento. "Nem sempre. Às vezes… você pode não ter uma alma gêmea."
Naruto piscou, ainda sorrindo, mas curioso. "Como assim?"
"Ou porque a pessoa ainda nem nasceu… ou porque ela simplesmente não existe."
Um silêncio pairou por um instante, pesado e incômodo. A menor desviou o olhar, arrependida de ter deixado a amiga continuar.
Mas Naruto apenas apertou os punhos, erguendo o rosto para o céu claro. "Isso não importa! Eu vou encontrar alguém que eu ame, de verdade! Dattebayo!"
As meninas o encararam, confusas com aquela confiança tão absurda. Ele sorriu para elas, agradecendo num aceno desajeitado, antes de sair correndo pelas ruas em direção ao ponto de encontro de seu time.
"Sakura-chan vai saber mais sobre isso, com certeza!"
O entusiasmo o carregava, deixando para trás os olhares frios e os cochichos.
"Sakura-chan! Sakura-chan!"
A voz inconfundível ecoava pela rua movimentada, clara demais para ser ignorada. Sakura, que até então se inclinava sutilmente em direção a Sasuke, aproveitando cada segundo perto dele, ergueu o rosto.
Naruto vinha correndo, braços balançando desajeitados, como sempre.
"Ei, Naruto!" ela acenou de volta, forçando um sorriso leve.
Sasuke, por outro lado, apenas lançou um olhar breve. Sem dizer nada, deu um passo para trás, aproveitando a distração de Sakura para se afastar mais alguns metros.
Quando Sakura voltou a virar para ele, encontrou apenas o espaço vazio. A pontada veio de imediato — um aperto forte, como se algo estivesse se fechando em seu peito. Seu olhar desceu para a mão esquerda, onde o fio vermelho, tênue e pulsante, estava enrolado firmemente em seus dedos. Apenas ela podia vê-lo. Apenas ela podia sentir aquela dor atravessando a pele como uma ferida invisível.
Ela respirou fundo, tentando ignorar, tentando não deixar transparecer. Virou-se de novo para Naruto, que já se aproximava, ofegante e animado como sempre.
"Sakura-chan! Preciso perguntar uma coisa importante!"
Ela ergueu a sobrancelha, surpresa com a seriedade repentina. "O quê?"
Naruto parou diante dela, ajeitou o protetor de testa e, com os olhos brilhando de expectativa, disparou:
"Esse lance de alma gêmeas… é de verdade mesmo? Todo mundo tem? Como funciona?!"
A surpresa de Sakura foi imediata. "Espera… você nunca ouviu falar disso?"
Naruto balançou a cabeça, confuso. "Nunca! Mas eu vi duas meninas falando, e elas disseram que é quando você descobre com quem vai ficar pra sempre, né? Tipo… destino!"
O sorriso dele se abriu ainda mais, infantil e genuíno.
Sakura piscou algumas vezes, tentando processar. Para ela, o fio era uma verdade tão constante, uma presença que sempre esteve ali. Era estranho imaginar Naruto, de todas as pessoas, ignorando aquilo até agora.
"Bem…" ela começou devagar, tentando organizar as palavras. "Quando nascemos, já nascemos predestinados a alguém, mas não é porque somos destinados a tal pessoa que signifique que ficaremos com ela. O seu fio vermelho… você sempre sente. Ele liga você à pessoa que está destinada a estar com você. Não importa quanto tempo passe ou a distância… o fio nunca se rompe, você sabe quando é ela ao tocar nela."
Naruto inclinou o corpo para frente, os olhos arregalados, absorvendo cada detalhe como se ela estivesse revelando um jutsu secreto.
"Uau…" ele murmurou, quase em reverência. "Então quer dizer que eu também vou ter esse fio? Que eu vou saber quem é a minha alma gêmea?"
A empolgação dele era tão genuína que Sakura precisou sorrir, mesmo com o fio apertado em sua mão, pulsando em um lembrete doloroso.
"Sim, Naruto. Mais cedo ou mais tarde, você vai descobrir, é estranho você ainda não ter descoberto ele, talvez ela não seja daqui."
Ele quase pulou no ar, os olhos brilhando como quando falava sobre se tornar Hokage. "Sendo ela daqui ou não, eu irei esperar!"
Sakura o observava, rindo, mas voltando seus olhares a Sasuke.
Sasuke caminhava à frente do time, o olhar fixo no horizonte, mas por dentro a tempestade nunca cessava. O fio vermelho… esse maldito fio que parecia zombar dele a cada batida do coração.
Ele sabia exatamente para onde o dele o levava. Não precisava puxar, não precisava questionar: Sakura. Sempre Sakura. Desde o instante em que percebeu aquele laço invisível enrolado em sua mão, ele compreendeu que seria um fardo — uma corrente disfarçada de destino.
Odeio isso.
O simples fato de sentir que algo além de sua própria vontade decidia por ele já era suficiente para corroê-lo por dentro. Ele, que havia perdido tudo, que só tinha em mente a vingança, não aceitava ser arrastado por algo tão… frágil. Tão inútil.
Para Sasuke, o fio não passava de uma pedra em seu caminho. Um obstáculo irritante que tentava desviá-lo de seu verdadeiro propósito.
E o que mais lhe causava repulsa era a intensidade da ligação. Porque não era apenas uma corda invisível. Era mais do que isso. Era um reflexo.
Tudo o que Sakura sentia, ele também sentia.
Quando ela sorria, uma fagulha involuntária queimava dentro dele, e isso o deixava furioso. Quando ela chorava escondida, tentando silenciar as lágrimas, o peito dele ardia como se fosse atravessado por estilhaços de vidro. E quando ela o olhava com aquele brilho esperançoso nos olhos, acreditando que poderia alcançá-lo, o coração dele pulsava mais rápido, não por escolha própria, mas por imposição daquele elo.
Ridículo.
Era como se estivesse condenado a compartilhar uma parte de si com alguém que ele não queria, alguém que para ele representava apenas atraso. Sakura não entendia sua dor, sua sede de vingança, e ainda assim o fio insistia em unir suas almas.
Houve momentos em que Sasuke tentou se libertar. Procurou maneiras, pesquisou, pensou em selos, em técnicas, em qualquer coisa que pudesse arrancar aquele laço da sua vida. Mas o fio jamais cedia. Não importava o quanto ele o ignorasse, não importava o quanto o amaldiçoasse. Continuava ali, firme, inquebrável, como se estivesse rindo da sua fraqueza.
O que era aquilo afinal? Destino? Prisão?
Sasuke não acreditava em destino. Para ele, cada passo era fruto da própria determinação. Então aquele laço só podia ser outra forma de aprisioná-lo, de testar sua resistência, de desviar seus olhos daquilo que realmente importava: vingança.
E no fundo, talvez fosse isso que mais o irritava. Porque mesmo odiando, mesmo desprezando, ele não conseguia ignorar totalmente. O fio vermelho pulsava, como uma cicatriz que nunca fechava, lembrando-o de que, queira ou não, havia alguém conectado a ele.
Mas Sasuke já havia feito sua escolha.
Esse vínculo, esse laço, esse fio vermelho… para ele não passava de uma maldição.
Uma maldição que jamais o impediria de seguir adiante.